Regina Celly Nogueira da Silva e Celênia de Souto Macêdo. A produção
do espaço urbano. Universidade Federal do Rio Grande do Norte/Universidade
Estadual da Paraíba.
Já sabemos que a cidade capitalista é uma
entidade socioespacial muito complexa. No entanto, nós precisamos compreender
como a cidade está estruturada internamente, ou seja, para entender a cidade é
preciso conhece-la por dentro, saber como ela se estrutura.
Desse modo, para entendermos detalhadamente
a cidade, é necessário “nos debruçarmos sobre aquilo que se chama de a organização
interna da cidade, a qual é a chave para chegarmos aos processos sociais que
animam o núcleo urbano e que estão envolvidos na dinâmica da produção do
espaço, e que é, ao mesmo tempo, uma chave privilegiada para observarmos e
decifrarmos a sua complexidade enquanto produto social” (SOUZA, 2003, p. 63).
Mas, o que seria essa organização interna
da cidade? Veja, qualquer cidade possui diferentes tipos de espaços, de
lugares, onde as pessoas vivem, trabalham, realizam seus negócios, fazem suas
compras, residem, divertem-se. Assim, existem áreas no interior da cidade onde
predomina claramente um determinado tipo de atividade. No interior da cidade
vamos encontrar áreas designidas para determinadas atividades, o que chamamos
de zoneamento urbano, ou seja, a cidade é organizada pensando nas
necessidades de uso dos seus habitantes.
A indústria, por exemplo, toda cidade possui
uma área destinada a instalação de fábricas e outras atividades complementares,
que estão intimamente vinculadas às atividades industriais. Comumente,
designamos esses espaços de distritos industriais.
Um exemplo interessante é a indústria de
montagem, como a automobilística, na zona do ABC, em São Paulo. Essa indústria
atrai para suas proximidades numerosas outras indústrias de peças e
componentes, como também, outros serviços que complementem a atividade
industrial.
Em outros espaços da cidade, encontramos o
comércio e os serviços. Esses espaços são denominados pelos estudiosos sobre a
questão urbana de localidades centrais intraurbanas. Essa
denominação refere-se a determinados lugares da cidade que possuem, no seu
conjunto, uma localidade dotada de maior ou menor centralidade em comparação
com outras localidades da cidade. Nossa existência no tempo nos é determinada,
mas temos ampla liberdade de escolha de nossa localização. Esta é influenciada,
embora não de todo, pelo nosso lugar de origem. Encontrar a localização correta
é essencial para uma vida de sucesso, também para um empreendimento de sucesso
e para um assentamento duradouro - em suma, para a sobrevivência do grupo.
Adicionalmente, uma localização adequada tem que ser a localização dos
acontecimentos certos. No espaço intraurbano vamos encontrar, às vezes, muitas
áreas que apresentam uma forte mistura de usos do solo urbano, ou seja, uma
localidade que é utilizada pela população como espaço de moradia, trabalho,
serviços e lazer (SOUZA, 2003).
Toda cidade possui um centro. Observamos, no
decorrer da história, que os centros das cidades têm recebido diversas adjetivações:
centro tradicional, centro de negócios, centro histórico, centro de mercado,
centro principal ou simplesmente centro. O centro corresponde, quase sempre, à
área onde a cidade foi fundada e que abriga prédios, casarões, igrejas, praças,
monumentos antigos, ou seja, uma área onde se concentram conjuntos
arquitetônicos de grande valor histórico. Em um primeiro momento, foi nessa
área, a que denominamos centro, onde se desenvolvia a vida da cidade, onde a
população residia e estabelecia relações de vizinhança, participava da vida
política da cidade, onde os negócios eram realizados, ou seja, onde a vida
acontecia.
A noção de centro urbano, como localização
ótima para onde convergem os trajetos, as atividades econômicas, o emprego, o
abastecimento ou as ações particulares, definindo-o, historicamente, como o
lugar das trocas comerciais, conduz ao conceito de centro de mercado.
Quando agregamos ao centro de mercado outras
atividades urbanas, como a religiosa, a de lazer, a política, a cultural, as
atividades financeiras e as de comando, podemos conceituá-lo de Centro de
Negócios (Central Business District – CBD) (VARGAS & CASTILHO, 2006). Esta visão
funcional do centro, atrelada à espacialização hierárquica das atividades
urbanas, dá origem aos conceitos de centros principais, subcentros, centros
regionais, centros locais, definidos pelos tipos de atividades oferecidas e
pelos seus raios de influência (VARGAS, 1985).
No entanto, quando a expansão das áreas
urbanas intensifica-se de modo espontâneo ou planejado, esta noção de Centro
começa a enfraquecer-se resultado do surgimento de novos subcentros de comércio
e serviços, que passam a concorrer com o Centro Principal. Podemos dizer, que
na cidade capitalista, este processo foi, sem dúvida nenhuma, um dos fatores
que mais contribuíram para a aceleração do processo de decadência e
desvalorização dos centros urbanos.
É preciso ter claro, contudo, que esse
quadro varia muito de acordo com o porte da cidade. Uma cidade pequena, às
vezes até uma cidade média, pode não conhecer a expansão do seu centro, ficando
as suas atividades limitadas ao centro antigo (SOUZA, 2003). Vários são os fatores
que influenciam no desenvolvimento ou não do seu centro como:
– o tamanho da
cidade,
– sua inserção na
rede urbana regional,
– o tamanho da sua
população,
– a renda da
população e a distribuição dessa renda,
– suas atividades
econômicas e serviços que oferece.
Por outro lado, as
metrópoles brasileiras viram seus centros se expandirem ao máximo possível,
incorporando os bairros centrais e as áreas contíguas ao mesmo. Um exemplo clássico
de centro expandido é o da Avenida Paulista, em São Paulo. No passado, essa
avenida foi eminentemente residencial e abrigou por muitas décadas a elite
cafeeira e industrial paulistana. Porém, paulatinamente, a avenida Paulista foi
perdendo seu caráter residencial, transformando-se, abrigando atividades de
natureza comercial e os serviços, que no passado eram encontrados apenas no
centro tradicional. Ao mesmo tempo, as famílias tradicionais que aí residiam,
transferem-se para bairros mais residenciais, mais arborizados, mais
tranquilos. Hoje, a Paulista é um centro comercial e de serviços para o
paulistano.
Assim, estudando a
cidade brasileira, verificamos fenômenos que se constituem a cada dia comuns às
cidades capitalistas. Um desses fenômenos é a perda cada vez maior de prestígio
do centro tradicional de suas cidades. Simultaneamente a esse processo, parte
da população de rendas mais altas que residiam no centro deslocam-se para
bairros residenciais de maior status social. O centro passa a abrigar, assim,
uma população de rendas mais baixas, quase sempre oriundas do interior do
Estado, que em busca da melhoria da qualidade de vida migra para a cidade.
O comércio de alto
padrão e os serviços mais refinados que aí se encontravam, tendem a deixar o centro
em busca de outras áreas, procuram se aproximar dos bairros que abrigam os
consumidores de alto poder aquisitivo. Esse comércio tende a se instalar nos
corredores de circulação, nas grandes avenidas e vias que ligam os bairros ao
centro tradicional.
Na medida em que a
cidade cresce, que seu tecido urbano se expande, as distâncias em relação ao
centro tradicional tendem a aumentar. Assim, para evitar que os moradores dos
diferentes bairros precisem se deslocar para o centro tradicional sempre que
necessitem adquirir um bem mais sofisticado que pão, leite, ou jornais, surgem
os subcentros (SOUZA, 2003). Dessa realidade, surge o que denominamos de
subcentros. Nos núcleos metropolitanos e nas cidades de porte médio os
subcentros não apenas florescem, mas, gradualmente, vão adquirindo grande
importância no universo da cidade, roubando do centro tradicional as atividades
econômicas e os serviços terciários.
No entanto, os
centros tradicionais de nossas cidades, apesar de sua notória decadência, continuam
sendo os focos irradiadores da organização espacial urbana (VILLAÇA, 1998).
Para esse autor, o centro tradicional ainda continua sendo a área mais
importante da cidade, possui um poder simbólico inquestionável, pois possui a
maior concentração de lojas, escritórios e serviços, como também, de empregos.
Vale salientar, que quanto menor a cidade, maior a parcela de seus empregos
terciários localizados no centro.
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